Greta Garbo, cujo nome já diz tudo, surge na era da ascensão cinematográfica. Um ícone para as mulheres, uma fantasia para os homens. Apesar de toda sua beleza e rico talento, a atriz tinha uma peculiaridade, abordada por Roland Barthes em seu livro Mitologias: um rosto inexpressivo. Um paradoxo para uma atriz que ficou mundialmente conhecida por seu talento. Como conseguiu expressar as emoções bucólicas do cinema da década de 30 e ainda assim ser um mistério quanto aos seus sentimentos? Podemos até padronizar sua característica, como: “Talentosa, mas meio Greta Garbo” ou “Esse jeito Garbo de atuar”. Garbo era única e ainda hoje indecifrável.
Para uma análise ainda maior do que era a atriz, tomemos como exemplo seus filmes. Grande Hotel, ganhador do Oscar de 1932, conta a história de um hotel luxuoso de Berlim e seus hóspedes, incluindo uma bailarina famosa, interpretada por Garbo; e um pilantra que tenta roubá-la. A grande questão do filme é a paixão entre o ladrão e a vítima, que acontece em uma noite. Como a maioria dos filmes dessa época, Grande Hotel mostra um amor fulminante com o rosto de Garbo. O afeto que ela cria pelo picareta não se compara às suas cenas melancólicas. Como fã, posso assumir com toda convicção: Garbo apaixonada soa artificial. Seja neste filme, Dama das Camélias, Anna Karenina. Sempre o papel da mulher abandonada que encontra um grande amor.
Barthes compara sua feição com a das artistas posteriores ao seu período, como a sempre Bonequinha de Luxo, Audrey Hepburn. Não analiso a beleza das duas, que é indiscutível, mas a expressão. Hepburn era viva, radiava em qualquer papel, seja como uma bon vivant de Nova York ou a filha de um motorista apaixonada platonicamente pelo homem rico. Seu brilho era natural enquanto Garbo tinha uma luz baixa, obscura e subjetiva. No entanto, as duas fizeram parte do imaginário masculino e inveja feminina.
Essa beleza feminina é mutável. Garbo tinha um jeito reservado, com um rosto forte mas ainda assim carente. Hepburn é sinônimo de luxo, classe e vivacidade. A coisa da mulher admirada mais por suas características do que sua beleza caiu com Sophia Loren, com uma imagem sexy, dotes físico admiráveis e seu ar fatal. Ainda hoje, os ícones femininos são espelhos dessa geração 70: Angelina Jolie e sua boca copiada pela maioria; Pámela Anderson e seios turbinados; Juliana Paes e seu corpo invejável. Muitas, impossível citar todas.
Apesar de todas essas referências, Garbo ainda tem lugar no imaginário das pessoas. Seu rosto forte, seu olhar fulminante e sua risada misteriosa. Em qualquer parte do planeta, seu talento é indubitável e referência para as novas gerações cinematográficas. Única, indiscutivelmente. Ao contrário de sua famosa frase, Garbo não precisa ficar sozinha. No talento, ela está em um nível incomparável, a léguas de distância por seu jeito peculiar de atuar.
Escutando Snow Patrol - Chocolate